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Regulamentação da exclusão forçada de acionistas minoritários, ou ‘squeeze-out’, de sociedades não cotadas na América Latina

Latam - 

Analisamos a regulamentação atual no Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru sobre a exclusão obrigatória de acionistas minoritários em empresas não cotadas – também conhecida com o termo ‘squeeze-out’- em suas respectivas jurisdições.

No contexto de uma operação de fusões e aquisições (M&A), pelo desenvolvimento natural de um negócio ou por restrições normativas à existência de sociedades unipessoais, é frequente encontrar a presença de acionistas minoritários numa sociedade por ações (não cotadas). Embora existam casos nos quais os acionistas majoritários e minoritários coexistem sem incidentes, também há situações em que esta coexistência não é possível, seja por interesses econômicos, interesses de negócio, falta de participação dos acionistas minoritários ou simplesmente porque os acionistas minoritários não aparecem e não se sabe onde residem. Nestas últimas hipóteses quem detém uma participação majoritária do capital de uma companhia poderia tentar eliminar a participação minoritária de terceiros no mesmo. Isso ocorre devido a diferentes razões, entre as quais podemos ressaltar a integração da companhia ao grupo empresarial do adquirente ou as diversas vantagens que, em matéria de governo corporativo, representa contar com 100% do capital social.

Diferentes jurisdições ao redor do mundo desenvolveram, através de legislação específica ou desenvolvimento jurisprudencial, vários mecanismos cujo efeito prático é a exclusão forçada de acionistas minoritários por parte do acionista majoritário. Assim, por exemplo, os tribunais do Estado de Delaware, inicialmente relutantes em permitir a realização de negócios jurídicos que visassem unicamente a exclusão dos acionistas minoritários de uma companhia, em 1983 mudaram seu posicionamento para permitir diferentes figuras através das quais se eliminava a participação de acionistas minoritários no capital social (squeeze-out): fusão (squeeze-out merger), alienação de ativos a uma matriz controlada pelo acionista majoritário e posterior liquidação da subsidiária, ou a consolidação ou redução de ações em circulação (reverse stock split).

A influência do direito societário de determinados estados dos Estados Unidos da América, que se caracterizaram por proteger a liberdade e flexibilidade dos regimes societários, nos permite evidenciar diferentes desenvolvimentos que se estão verificando em matéria de exclusão forçada de acionistas minoritários de sociedades não cotadas, em maior ou menor medida, em jurisdições de tradição civilista, tal como se enuncia a seguir para o caso do Brasil, Chile, Colômbia, México e Peru. Devemos esclarecer que este documento comparativo não aborda a exclusão ou compra forçada de acionistas minoritários de sociedades cotadas, no âmbito das normas próprias do mercado de valores ou em operações de OPA em bolsa de valores.

 

CHILE

Existem diversos dispositivos na legislação chilena que permitem a exclusão de um sócio ou acionista da respectiva sociedade. A respeito disso, o Código Civil, em seu artigo 2087, estabelece uma causa comum aplicável a todas as sociedades em virtude da qual se, por uma mudança de circunstâncias, não for possível conseguir o objeto da sociedade sem aumentar os aportes, o sócio que não consentir isso poderá retirar-se, e será obrigado a retirar-se se os restantes sócios exigirem sua exclusão.

No que diz respeito às sociedades de pessoas comerciais (sociedades coletivas e sociedades de responsabilidade limitada), estão previstos no Código Comercial certos casos em que se pode excluir um sócio. Essa exclusão é consequência, principalmente, do descumprimento por parte de algum sócio das suas obrigações referentes à sociedade ou aos demais sócios da sociedade, como a demora na entrega do aporte social, a aplicação de fundos comuns a negócios particulares do sócio excluído e a utilização da razão social em negócios particulares de algum sócio. Motivos adicionais de exclusão poderão ser ajustados no contrato social.

No caso das denominadas sociedades por ações (SpA), que são sociedades de capital que têm uma regulamentação mais flexível do que as Sociedades Anônimas, o inciso 2° do artigo 435 do Código Comercial determina de forma expressa que o estatuto poderá estabelecer que “sob determinadas circunstâncias se possa exigir de todos ou de parte dos acionistas a venda das ações, seja a favor de outro acionista, da sociedade ou de terceiros”, devendo regular-se os efeitos, obrigações e direitos que surgirem para os acionistas. Em resumo, no caso de uma SpA, se os estatutos contemplarem expressamente essa situação poder-se-á forçar a venda da participação acionária de um ou mais acionistas.

No caso das sociedades anônimas fechadas, não existe um dispositivo legal que estabeleça de forma expressa um squeeze-out ou venda forçada de acionistas. Contudo, nada impede que os estatutos de uma sociedade anônima fechada contemplem cenários de venda forçada de ações. Assim, por exemplo, os estatutos da sociedade poderiam conter a obrigação de que determinados acionistas da sociedade vendam ou cedam suas ações na sociedade ao acionista controlador, ou o direito deste de comprar as ações dos acionistas minoritários (opções de venda ou de compra). Além disso, poderia estabelecer-se nos estatutos sociais — ou num pacto de acionistas — a obrigação de os acionistas minoritários venderem e alienarem suas ações na sociedade caso o controlador da mesma decida vender suas ações e o controle a um terceiro (direito de arraste), o que forçaria os acionistas minoritários a saírem da sociedade.

Por último, se um acionista não pagar as ações que subscreveu numa sociedade anônima no prazo estabelecido nos estatutos ou na lei, o artigo 17 da Lei das Sociedades Anônimas determina que a sociedade tem poderes para vender numa Bolsa de Valores Mobiliários todas ou parte das ações subscritas pelo acionista inadimplente, por conta e risco deste, até serem satisfeitos os saldos não pagos e as despesas da alienação, sendo reduzida a quantidade de ações que o acionista inadimplente possuir.

 

COLÔMBIA

A legislação colombiana não possui expressamente um dispositivo de direito positivo que permita a exclusão forçada de um acionista minoritário do capital da companhia. Além disso, existem certas figuras que poderiam levar a entender que a implementação de medidas, como as previstas nos sistemas anglo-saxões, viola os direitos dos acionistas minoritários.

A seguir faremos um breve resumo dos desenvolvimentos legais, jurisprudenciais e doutrinais em relação à exclusão de acionistas minoritários no âmbito jurídico colombiano.

Como antecedente relevante vale a pena ressaltar a Lei 510 de 1999 que permitia, após decisão favorável de sua assembleia, às companhias com valores inscritos no mercado público de valores readquirirem as ações do acionista que não tivesse exercido seus direitos durante 20 anos. Contudo, por considerá-la contrária à inviolabilidade da propriedade privada e ao direito de defesa do acionista minoritário, o Tribunal Constitucional declarou inexequível esse dispositivo previsto no artigo 70, eliminando-o do ordenamento jurídico.

Não obstante a decisão do Tribunal Constitucional em relação ao artigo 70 da lei 510 de 1999, recentemente a Superintendência de Sociedades, entidade administrativa com funções jurisdicionais, reconheceu em suas decisões, tanto jurisdicionais quanto doutrinais, a possibilidade de excluir acionistas minoritários através de certas figuras jurídicas estabelecidas na lei cuja implementação teria, como efeito prático, a exclusão forçada de acionistas minoritários, entre as quais se incluem a fusão sem adscrição de acionista e a alienação global de ativos, aos quais faremos referência a seguir, junto com outros mecanismos previstos no ordenamento jurídico colombiano que cumprem o  mesmo propósito. 

a. Fusão sem adscrição de acionistas

A Lei 1258 de 2008, mediante a qual foi incluída no ordenamento jurídico colombiano a tipologia de sociedade por ações simplificada, permite aos acionistas de uma sociedade absorvida por fusão receberem, como única contraprestação, dinheiro em espécie em vez de ações na absorvente. Deste modo, o acionista maioritário poderia consolidar 100% da propriedade sobre o capital da absorvente, enquanto que os acionistas minoritários receberiam apenas dinheiro em espécie como contraprestação por sua exclusão do capital social. Para levar a efeito a fusão nestes termos, o acionista majoritário deverá contar com uma maioria que lhe permita preencher os requisitos previstos nos estatutos sociais.

b. Alienação global de ativos

A companhia aliena todos seus ativos e passivos a um terceiro que é 100% controlado pelo acionista majoritário daquela. Após a venda, realiza-se a dissolução e liquidação da companhia, de tal modo que os acionistas minoritários recebam o pagamento do preço de venda como distribuição de remanescentes na liquidação.

c. Cisão parcial

Conforme o previsto no artigo 3 da Lei 222 de 1995, os acionistas de uma companhia cindida podem participar da companhia beneficiária numa proporção diferente da que tinham naquela. Isto significa que os acionistas da cindida podem, inclusive, não participarem do capital da companhia beneficiária. Em qualquer caso, uma decisão deste tipo deverá ser tomada por unanimidade dos presentes na reunião da assembleia em que a cisão for aprovada.

d. Prescrição extintiva de direitos econômicos e políticos

Ao se considerar que os direitos que as ações de uma companhia outorgam são direitos patrimoniais, a companhia pode alegar perante um juiz da República (seja por ação ou como exceção) a prescrição extintiva dos direitos econômicos e políticos que não tenham sido exercidos pelo acionista minoritário durante o prazo de prescrição aplicável (10 anos).

 

MÉXICO

No México, segundo o tipo de sociedade em questão, poderiam ser aplicadas certas causas de exclusão de sócios. Os tipos de sociedades comerciais mexicanas mais utilizados são a sociedade anônima (S.A.), a sociedade de responsabilidade limitada (S. de R.L.), e a sociedade anônima promotora de investimento (S.A.P.I.). Esta última é uma modalidade da própria S.A.  

a. Sociedade de Responsabilidade Limitada

Na sociedade de responsabilidade limitada, que é considerada uma sociedade de pessoas conforme a norma mexicana, existem causas específicas de exclusão de sócios determinadas na lei. O artigo 50 da Lei Geral de Sociedades Comerciais (LGSM), aplicável à S. de R.L. em  conformidade com o previsto no artigo 86 do mesmo ordenamento, estabelece que os sócios das sociedades de responsabilidade limitada podem ser excluídos dessa sociedade pelas seguintes causas: (i) por uso da firma ou do capital social para negócios próprios, (ii) por infrações ao estabelecido nos estatutos sociais, (iii) por infração aos dispositivos legais que lhe forem aplicáveis, e (iv) por comissão de atos fraudulentos ou dolosos contra a companhia.

b. Sociedade Anônima

Na sociedade anônima, que é considerada uma sociedade de capital conforme a norma mexicana, existe apenas uma causa específica de exclusão de acionistas expressamente estabelecida pela lei. Em relação ao acima referido, os artigos 118 e seguintes da LGSM estabelecem um mecanismo para separar da sociedade aqueles acionistas inadimplentes que não tiverem pago, no prazo combinado, ações subscritas pendentes de pagamento.

Contudo, como consequência de uma série de reformas das leis comerciais realizadas no ano de 2014, o artigo 91 da LGSM foi modificado, sendo estabelecido que as sociedades anônimas podem incluir em seus estatutos sociais estipulações que determinem causas de exclusão de sócios. Portanto, os acionistas da S.A. podem acordar livremente causas de exclusão de sócios nos estatutos da sociedade.  

Na prática, algumas das causas de exclusão de acionistas que normalmente são estabelecidas nos estatutos sociais da S.A. são: (i) concorrer com o mesmo giro comercial que a sociedade ou ser sócio ou acionista de uma sociedade concorrente, (ii) não comparecer durante um determinado período de tempo às assembleias de acionistas, e (iii) não cumprir as obrigações de venda forçada estabelecidas nos estatutos da sociedade. Estes são alguns exemplos, porém não é uma lista exaustiva de possíveis causas de exclusão.

Ainda não existem suficientes precedentes ou decisões judiciais no México que ajudem a interpretar os dispositivos mencionados e a aplicação prática dos mesmos. No entanto, consideramos que é importante, na prática corporativa ou societária, aplicar de modo adequado os dispositivos acima referidos. Isto é, evitar aprovar reformas de estatutos ad-hoc que visem excluir um grupo de acionistas aprovando uma reforma que, de antemão, se pretende aplicar apenas a esse grupo. Se uma causa de exclusão de acionistas tiver sido estabelecida nos estatutos no início da sociedade, ou antes de qualquer conflito de acionistas, a aplicação de uma causa dessa naturaleza terá mais possibilidade de passar o escrutínio judicial, chegado o momento. 

O previsto neste ponto também é aplicado para a S.A.P.I.

 

PERU

A Lei Geral de Sociedades peruana não contempla uma figura expressa que permita a aquisição ou exclusão forçada de acionistas minoritários por parte do acionista majoritário. No entanto, um setor da doutrina peruana considera que uma operação de squeeze-out é viável apontando que, sob certas circunstâncias, é possível instrumentalizá-la sem que o direito de propriedade previsto na Constituição Política do Peru seja violado ou se considere que ela constitui um abuso do direito.

Contudo, além de estruturar um squeeze out de forma que não se viole o direito de propriedade ou se configure uma situação de abuso de direito, importa destacar que sob a legislação societária peruana existem outras barreiras potenciais como (i) a impossibilidade de reduzir o capital social afetando apenas alguns acionistas sem contar com o voto favorável da totalidade das ações subscritas com direito a voto; (ii) a impossibilidade de impor obrigações de caráter econômico a acionistas sem seu consentimento; (iii) a ausência da figura do cash out merger, e (iv) a regulamentação societária de conflito de interesses que impediria um acionista de votar numa situação na qual exista um conflito de interesse (p.ex. transferir ativos para uma empresa controlada por ele). 

Atendendo ao acima referido e à falta de precedentes vinculantes que outorguem mais previsibilidade jurídica, não é possível garantir que uma estrutura de squeeze out esteja isenta de riscos. Apesar disso, a seguir detalhamos alguns exemplos de figuras que foram analisadas e consideradas potencialmente viáveis no passado. Não recomendamos implementar estas figuras que estão sujeitas, em cada caso, a uma análise específica dos documentos constitutivos da sociedade, dos fatos e comportamento das partes, bem como da sua viabilidade tributária e da continuidade do negócio:

a. Dissolução e liquidação

Acordar com as maiorias estabelecidas a dissolução e liquidação da sociedade no âmbito da qual o acionista majoritário obtenha os ativos relevantes do negócio.

b. Causas de exclusão

A modificação do estatuto social que vise incluir causas de exclusão que permitam, no futuro, aprovar a exclusão de um acionista minoritário (p.ex. ausência de participação, conflito de interesse etc.).  Logicamente, a causa pela qual se estabeleça a exclusão deverá ser configurada após a aprovação da modificação e ser objetiva.

c. Redução e aumento de capital

Entendemos que a operação implementada comportou a redução de capital social a zero por um breve momento, com um aumento de capital por novos aportes de imediato no qual se conferiu a todos os acionistas o direito de subscrever ações. Este mecanismo foi explorado nos casos em que os acionistas minoritários não são ativos (p.ex. sucessivos herdeiros ou desconhecimento do domicílio). Esta estrutura teria mais fundamento nos casos em que a redução é requerida por lei.

 

BRASIL*

*conteúdo elaborado pelo escritório brasileiro NBF|A

A legislação brasileira regulamenta a possibilidade de saída forçada dos acionistas minoritários em diversas normas previstas, tanto na Lei das Sociedades por Ações (Lei n.º 6.404/76, conforme suas modificações posteriores) quanto no Código Civil Brasileiro (Lei n.º 10/406/2002).

A Lei das Sociedades por Ações brasileira prevê a possibilidade de os estatutos ou a assembleia geral de acionistas autorizarem a aplicação de ganhos ou reservas no resgate ou na amortização de ações (art. 44) em sociedades não cotadas. No entanto, ao contrário do mecanismo de squeeze-out previsto para as sociedades cotadas, o resgate das ações de um mesmo tipo para sociedades não cotadas só será possível se os acionistas que representam, no mínimo, a metade das ações atingidas assim aprovarem em assembleia geral especialmente convocada.

Por outro lado, para os casos específicos das sociedades limitadas, o Código Civil Brasileiro (art. 1.085) autoriza expressamente, em alguns casos, que a maioria dos sócios determine a exclusão dos sócios minoritários quando entenda que estes estão pondo em risco a continuidade da empresa por atos graves comprovados.

Além destes mecanismos previstos na legislação, a prática comercial brasileira desenvolveu outras alternativas que podem dar lugar à exclusão forçada de acionistas minoritários de sociedades não cotadas, como é o caso da venda de ativos a uma sociedade do grupo do controlador, com a posterior liquidação da sociedade da qual os minoritários participavam, ou da execução de diferentes tipos de cláusulas previstas nos pactos de acionistas que resultam na exclusão dos minoritários como, por exemplo, opções de compra das ações dos minoritários a favor do controlador, drag along (obrigação de venda conjunta) do acionista minoritário em caso de alienação de ações pelo controlador, entre outros. Em qualquer caso, antes de implementar alguma destas alternativas deve ser feita uma análise específica de cada caso para determinar sua viabilidade e riscos.