COVID-19: Medidas excecionais para a Justiça e Tribunais portugueses
Alerta Contencioso e Arbitragem Portugal
Em 2 de abril de 2020, a Assembleia da República aprovou a Lei nº 4-A/2020, de 6 de abril, a qual veio proceder à primeira alteração à Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, diploma este que tinha vindo determinar diversas medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, com impacto na área da Justiça e dos Tribunais. Desde cedo, em matéria de prazos, diligências e entrada em vigor, ficaram expostas diversas insuficiências, imprecisões e dúvidas interpretativas associadas à aplicação de tal relevante diploma.
Em resposta e procurando reestabelecer segurança jurídica numa área fundamental para a efetivação do acesso ao direito e aos tribunais, surge agora a Lei nº 4-A/2020.
O presente Alerta apresenta os pontos mais relevantes deste regime excecional e temporário tal como resulta da alteração que ora se aprova.
I. Prazos Processuais
A. Processos não urgentes
- Determinou-se a suspensão dos prazos processuais.
- Sem prejuízo das exceções abaixo referidas, este regime de suspensão aplica-se a todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais a realizar no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos perante tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal.
- A suspensão aplica-se também a quaisquer atos a realizar em sede de processo executivo, designadamente os referentes a vendas, concurso de credores, entregas judiciais de imóveis e diligências de penhora e seus atos preparatórios, com exceção daqueles que causem prejuízo grave à subsistência do exequente ou cuja não realização lhe provoque prejuízo irreparável, prejuízo esse que depende de prévia decisão judicial.
- São suspensas ainda as ações de despejo, os procedimentos especiais de despejo e os processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o arrendatário, por força da decisão final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta de habitação própria ou por outra razão social imperiosa.
- No entanto, tal suspensão não obsta:
- À tramitação dos processos e à prática de atos presenciais e não presenciais não urgentes quando todas as partes entendam ter condições para assegurar a sua prática através das plataformas informáticas que possibilitam a sua realização por via eletrónica ou através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;
- A que seja proferida decisão final nos processos em relação aos quais o tribunal e demais entidades entendam não ser necessária a realização de novas diligências.
B. Processos urgentes
- Os processos urgentes continuam a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências, observando-se quanto a estes o seguinte:
- Nas diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, a prática de quaisquer atos processuais e procedimentais realiza-se através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;
- Quando não for possível a realização das diligências que requeiram a presença física das partes, dos seus mandatários ou de outros intervenientes processuais, nos termos da alínea anterior, e esteja em causa a vida, a integridade física, a saúde mental, a liberdade ou a subsistência imediata dos intervenientes, pode realizar-se presencialmente a diligência desde que a mesma não implique a presença de um número de pessoas superior ao previsto pelas recomendações das autoridades de saúde e de acordo com as orientações fixadas pelos conselhos superiores competentes;
- Caso não seja possível, nem adequado, assegurar a prática de atos ou a realização de diligências nos termos previstos nos pontos anteriores, aplica-se também a esses processos o regime da suspensão acima referido para os processos não urgentes.
- São também considerados urgentes, para este efeito:
- Os processos e procedimentos para defesa dos direitos, liberdades e garantias lesados ou ameaçados de lesão por quaisquer providências inconstitucionais ou ilegais, referidas no artigo 6.º da Lei n.º 44/86, de 30 de setembro;
- O serviço urgente previsto no n.º 1 do artigo 53.º do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março;
- Os processos, procedimentos, atos e diligências que se revelem necessários a evitar dano irreparável, designadamente os processos relativos a menores em risco ou a processos tutelares educativos de natureza urgente e as diligências e julgamentos de arguidos presos.
C. Insolvência
- Nos termos legais, o devedor deve requerer a declaração da sua insolvência dentro dos 30 dias seguintes à data do conhecimento da situação de insolvência [sendo considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas], ou à data em que devesse conhecê-la.
- Por força desta alteração à Lei nº 1-A/2020, o prazo referido na alínea (a) fica também suspenso.
D. Outros procedimentos
- O acima referido aplica-se, ainda, com as necessárias adaptações, à prática de atos em:
- Procedimentos que corram termos em cartórios notariais e conservatórias;
- Procedimentos contraordenacionais, sancionatórios e disciplinares, incluindo os atos de impugnação judicial de decisões finais ou interlocutórias, que corram termos em serviços da administração direta, indireta, regional e autárquica, e demais entidades administrativas, designadamente entidades administrativas independentes, incluindo a Autoridade da Concorrência, a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, o Banco de Portugal e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, bem como os que corram termos em associações públicas profissionais;
- Procedimentos administrativos e tributários (nestes últimos são abrangidos apenas alguns atos processuais) no que respeita à prática de atos por particulares.
- Os prazos relativos à prática de atos realizados exclusivamente por via eletrónica no âmbito das atribuições do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) não são suspensos.
E. Regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários
- Durante a vigência das medidas acima referidas e até 60 dias após a cessação das mesmas em data a definir por decreto-lei, no qual se declara o termo da situação excecional, ficam suspensos:
- A produção de efeitos das denúncias de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio;
- A caducidade dos contratos de arrendamento habitacionais e não habitacionais, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação;
- A produção de efeitos da revogação, da oposição à renovação de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional efetuadas pelo senhorio;
- O prazo indicado no artigo 1053.º do Código Civil [prazo para a restituição do prédio, em qualquer dos casos de caducidade previstos nas alíneas b) e seguintes do artigo 1051.º do Código Civil], se o término desse prazo ocorrer durante o período de tempo em que vigorarem as referidas medidas;
- A execução de hipoteca sobre imóvel que constitua habitação própria e permanente do executado.
F. Prescrição e caducidade
Os prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos ficam igualmente suspensos.
G. Entrada em vigor e duração
Estas medidas produzem efeitos desde o dia 9 de março de 2020, com exceção das referentes aos processos urgentes e ao INPI, as quais entram em vigor no dia 7 de abril de 2020, e do regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários, o qual produz efeitos a 12 de março de 2020.
Este regime vigora até à declaração, por decreto-lei, da data da cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.
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